Enquanto tomava banho pensava que aqui em casa ainda não se tinha comentado o vídeo do Lorenzo e Pedro, o vídeo de dois rapazes que desfilam por Lisboa de mãos dadas.
Até que me sentei com a mãe, começou por dizer que os rapazes foram ao Goucha, que havia um que não se calava, se já tinha visto, (estive a trabalhar... ok?), devia ver...
A certa altura do alto do sua sabedoria disse: Puff... andar de mãos dadas em Lisboa, grande coisa, claro que ninguém ia dizer nada... Pensei que o assunto morresse por ali, mas continuou: Dois Homens andarem de mãos dadas... hummm... acho feio.
Resumindo acha feio, que é como quem diz Miguel não andes na rua de mãos dadas com homens tá bem?
Está bem mãe, está bem, só se não calhar ou HT não me der a mão, mas só aos bocadinhos que eu nem sempre estou com espirito para ser olhado de lado.
Já tinha mais de dezoito. Tinha um encontro marcado. Arranjei-me o melhor que pude. Vesti a roupa que mais gostava e me ficava melhor.
E fui à aventura, sou tímido nos primeiros dez minutos, sei dar conversa, sou mau a começar uma conversa. E se a pessoa responder com sim e não, então fica muito difícil.
Quando nos encontramos simpatizamos um com outro, era giro, e falava bem.
À primeira vista enchia-me as medidas.
A conversa fluía bem até que de repente passou a ser um monologo. O rapaz falava tão rápido, que cortava o pio, e sempre que dizia algo ele aproveitava e zás, o melhor da sua equipa, o melhor filho, o melhor aluno, o melhor vizinho, o melhor a defender os desfavorecidos, o melhor o melhor em tudo. Era tão bom que comecei a cantar baixinho aquela musica: Quis saber quem sou/ o que faço aqui/ quem me abandonou de quem me esqueci... Cheguei à fase de desespero em que já olhava para a porta e pensava desato aqui a correr e nunca mais me apanho, porém ele também devia ser melhor a correr.
Acho que o deixei de o ouvir, até que acabamos as bebidas e eu já não sabia o que fazer para não ser rude nem mal educado. Sei que saímos e ainda levei com mais meia hora de conversa até ao carro.
Levei-o a casa, e fui convidado a subir, recusei o mais gentil possível, armei-me em menino, ah já é tarde, amanhã tenho de me levantar cedo. Enfim, até me custou. Mas aposto que o rapazinho não ia calar a boca nem mesmo na hora H.
Hoje de manhã juntei um colega e um estagiário para fazerem uma tarefa em conjunto.
O meu colega é bom camarada, mas estava a ter uma atitude parva para com o outro rapaz. Eu tinha posto o Bruno (o estagiário) a ajuda-lo e ele em vez de aproveitar a ajuda estava a complicar o trabalho do Bruno.
Enquanto o Bruno foi fazer outra tarefa eu disse ao Neves para ter cuidado, que não estava a ajudar o Bruno, tinha de ter cuidado e atenção porque era a primeira vez que o Bruno estava a fazer aquele trabalho. Eu fiz um comentário qualquer depois de perceber que havia ali um atrito e perguntei qual era o problema. Ao que o Neves reponde:
- Foda-se o gajo é paneleiro e está se a fazer a mim e eu não gosto disso (e não estava). - Eu passei-me está claro, ofendeu-me, tocou-me na ferida, ele não sabe que sou gay, mas o preconceito servia para mim também, se ele soubesse se calhar não nos dávamos bem. Eu perguntei se ele atrasado, expliquei que aquilo era preconceito, uma atitude infantil, e devia ter feito uma cara de zangado, fiquei vermelho de fúria, a conversa seguiu-se em modo bruto, também lhe disse que era novo para ter aquele preconceito todo. Claro que o preconceito ou homofobia nada tem a ver com a idade. Ele desculpou-se, disse que estava a brincar e mandou uma piada para o ar. Certo,certo é que enquanto não trocou de ajudante não ficou descansado.
O Bruno é gay, e não deve esconder, nunca lhe perguntei, mas percebe-se à primeira. O Bruno percebeu, quase de certeza, a situação do Neves não querer trabalhar com ele, nada disse e eu também não toquei no assunto. Pensei várias vezes do preconceito, más caras, gozo e etc. que os gays têm que aturar.
Levei festinhas da patroa por ser um querido. Se os colegas ouvissem, diriam gracita, mas não sou apenas querido, e há dias que sou gracita, é para compensar os dias que não a posso ver.
À tarde fui ter uma aula de treino básico com o cão. Mandei mensagem ao Alex a dizer: Vou ter aulas com a Diana (o nome do meu cão). Perguntou-me se era boa, ainda pensei que estava a gozar comigo, é preta e tem 4 patas, respondi, recebi como resposta um grande ohhhhhh, ele é distraído.
Cheguei a casa e tenho cá malta um a pintar as portas outro a instalar coisas na casa de banho e pronto, nunca mais me vejo livre destes tipos. Tenho um cheiro a tinta em casa que estou quase a alucinar e a ter visões.
A primeira vez que contei a alguém que era gay foi ao Alex e à Susy, não de livre vontade. Passo a contar. Estávamos numa esplanada a beber café, não sei em que parte a que a conversa ia até que o Alex pergunta:
- Olha lá, no motor de busca do google e do Kazaa tens a palavra gay e gay-porn? E vi no histórico tens muitas paginas do género... (tinha dado o PC ao Alex para ele arranjar).
Devia ter ficado branco, azul ou amarelo, em 30 segundos pensei a maneira de me escapar, de mentir ou contar a verdade. E ele perguntou se era gay, e eu respondi sim.
Não neguei contei a verdade, partilhei as minhas historias, como tinha encontros às escondidas, mesmo debaixo dos narizes deles. Não caiu o Carmo nem a Trindade. Fiquei contente por ter contado, contudo fiquei com pena de ter perdido este segredo, o que no fundo era bom.
A partir dali, foram aceitando sem dramas. E continuamos todos amigo.
Naquele dia senti-me bem de ter contado, comecei a utilizar o código, se não perguntarem não digo, se perguntarem respondo. Se apresentar o meu namorado como tal, fica obvio.
Quem sabe também ajuda, contam sempre a alguém, sabes é gay, tipo cartão de visita.
Pior foi com os meus pais, mas isso conto noutro dia
Na entrevista polémica dada por Domenico Dolce e Stefano Gabbana, à revista Panorama, os estilistas expressaram a sua opinião e declararam: "Somos contra adopções por parte de gays. A única família é a tradicional", e ainda que são contra às barrigas de aluguer e à fertilização in vitro.
Cada um tem direito às suas opiniões e sinceramente não me choca, fico admirado de eles pensarem assim, que sendo gays tenham assim tantos contra, talvez eles saibam que dariam uns péssimos pais, e se calhar formariam uma péssima família.
Eu cá acho que daria um bom pai, e conseguiria fazer um criança feliz. Como sabemos existem muitas formas de família, talvez a única família seja a tradicional, contudo até as famílias tradicionais não são perfeitas, todos sabemos, e essas famílias muitas vezes transformação em outro tipo de famílias, assim é a vida.
Continuo a acreditar que não depende do género, da idade, da orientação sexual, etc, que define a capacidade de formar uma família, ou criar um filho. O principal acho que é o amor e amor tenho muito para dar.